No transcorrer da história, Deus faz – e cumpre! – um sem número
de promessas ao ser humano. A Escritura sagrada coloca em evidência esses
comprometimentos de Deus de uma forma emblemática na figura do patriarca Abraão
e em sua descendência, protótipo da pessoa de quem o Senhor se agrada.
Mas, tenhamos em conta que Abraão está longe de ser um primor de
criatura. Além do que já conhecemos dele – um velho, fracassado em seus
projetos de alcançar a felicidade – os escritores bíblicos – notadamente São
Paulo – destacam a sua obediência àquilo que Deus lhe pede/ordena e a confiança
quase cega que o patriarca deposita naquele que lhe fez uma promessa crucial.
Contudo, examinando a trajetória de Abraão é possível encontrar,
aqui e ali, alguns pontos em que nos parece haver um quê de desobediência e/ou
desconfiança. Quando mente ao faraó, quando tem Ismael com Agar; são detalhes de
sua caminhada que demonstram a ansiedade em presenciar o desfecho da história,
apressar o cumprimento da promessa. Isso, porém, não o desclassifica perante o
Altíssimo. Abraão ainda não tem a perfeição do discernimento para entender que
Deus, não sendo um ser humano, não engana, não se atrasa, antes faz valer tudo
o que disse; no seu tempo, não no nosso.
O problema que aparece em Abraão – que é também o nosso – é
querer estabelecer um prazo para que o Senhor cumpra o prometido, realize
aquilo que disse que faria acontecer.
É o que se repete numa escala diferente com o povo de Israel.
Escravos durante séculos no Egito, onde experimentaram toda espécie de
sofrimento e humilhação, não querem mais esperar para que as promessas,
renovadas aos descendentes de Abraão por meio de Moisés, se tornem realidade.
Querem pão e água já; aceitam o Senhor como seu Deus, mas pouco depois querem
substituí-lo por um bezerro de ouro, pois não conseguem ver àquele que os
livrou da escravidão. Em diversos momentos durante o trajeto duvidam da
promessa de liberdade que lhes foi apresentada, além de habitar numa terra
“onde corre leite e mel” em abundância.
Da mesma forma ocorre conosco, com você e comigo. Com o batismo
recebido, mesmo em criança, veio junto uma promessa de felicidade eterna, uma
vida de gozo e de alegria. Essa promessa, ainda que dela não tenhamos tido
conhecimento até agora, permanece em expectativa. Ou seja, Deus continua
disposto a cumpri-la, quer cumpri-la na vida de cada um, pois é fruto de seu
amor inenarrável pela humanidade que criou e que, mesmo decaída por causa do
pecado, tem a oportunidade de se reconciliar com o Pai, graças ao dom obtido
pela morte e ressurreição de Jesus Cristo.
É nele, o Unigênito, o Príncipe da Paz, que Deus estabeleceu
como único verdadeiro intercessor, que podemos alcançar a graça de voltar ao
caminho que conduz ao Reino. A sua completa obediência à vontade de Deus nos
permite usufruir novamente da herança que havíamos perdido ao rejeitar a
vontade do Senhor em nossa história escolhendo os nossos vícios e fraquezas.
Claro que há condições, mas estas se encontram ao nosso alcance,
não se trata de uma armadilha. Deus quer de nós o mesmo que pediu – e obteve –
de Abraão: confiança, obediência, esperança.
Confiar na fidelidade do Deus que Jesus nos revelou como sendo
seu Pai e que deseja ser também nosso. Obediência à orientação que nos oferece
para que não nos desviemos da trajetória que nos leva ao Reino dos Céus. E
esperança – aguardar o tempo de Deus, o momento em que toda essa expectativa se
transformará em realidade, e tudo o que é hoje promessa enfim se realizará.
Para isso é preciso “trabalhar” a nossa ansiedade. Por termos
vivido a experiência do pecado, o mundo nos tem ensinado a acumular coisas –
bens, afetos, etc. – e não sabemos partilhar; fomos catequizados para ver no
outro um inimigo, alguém que vem nos roubar o que amealhamos. Disseram-nos – e
acreditamos nisso! – que a nossa história é má e a culpa é de Deus.
Ensinaram-nos uma enormidade de mentiras entremeadas com algumas poucas
verdades e por isso trazemos conosco a insegurança, a incerteza, uma completa e
insaciável insatisfação.
Por meio de sua Igreja Cristo quer nos reconstruir, refazer em
nós a criação, para que possamos voltar ao que éramos no princípio dos tempos –
amigos de Deus.
Convenhamos que isso é tarefa árdua e demorada. É preciso que
nos esvaziemos dos falsos conceitos e das falsas verdades que nos ensinaram – e
que nos desconstruíram – para que possamos assimilar a verdadeira beleza de
pertencer ao Deus Pai amoroso que Cristo nos apresenta.
Esse é o nosso esforço: permitir que Deus aja em nós, nos faça
pessoas novas, onde o Espírito Santo possa habitar e transformar em verdadeiros
filhos de Deus. Aprender a amar, da mesma forma que temos sido amados por Deus
e pela Igreja.
Somente assim estaremos prontos para acolher o que Deus tem nos
prometido desde sempre e aguarda o momento certo de nos entregar, para que a nossa
felicidade seja enfim completa.
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